Se Odorico Paraguaçu fosse candidato a prefeito de Sucupira nas próximas eleições municipais, em 6 de outubro, teria dificuldade de se eleger. Para chegar lá, o personagem da novela O Bem Amado (1973) deveria abandonar o discurso populista e a prática de trocar favores por votos e adotar uma plataforma política com proposta efetivas para saúde, educação, cuidado e zeladoria da cidade, segurança pública, saneamento, infraestrutura e emprego, temas recorrentes em pesquisas eleitorais.
“Eu acho que prefeitos como Odorico Paraguaçu felizmente estão em extinção. Ele não é mais um tipo paradigmático”, avalia o economista Jorge Jatobá, professor titular aposentado da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e ex-secretário nacional de Política de Emprego e Salário (1995-1998).
Segundo o economista, em vez do perfil clientelista como o do personagem criado pelo dramaturgo Dias Gomes (1922-1999) para o teatro, e posteriormente visto na televisão, rendem voto nas eleições locais “discursos consistentes” e propostas que possam gerar empregos. “Os prefeitos têm que ser desenvolvimentistas, no sentido de promover oportunidades de negócio e investimento em seus municípios. Emprego é resultado de crescimento econômico.”
Para isso, os candidatos a novos prefeitos precisam “manter a visão voltada para o crescimento da economia local” e, se eleitos, atrair empreendimento, “melhorando a infraestrutura do município, o acesso à cidade e a qualificação da força de trabalho.”
Conforme o Jatobá, isso exige aptidões para articular e envolver a sociedade civil, forças produtivas locais, como empresários rurais e comerciantes. Também conta positivamente mobilizar o governo estadual e até o governo federal em torno da pauta municipal. “Assim se cria um círculo virtuoso em que quanto maior o crescimento, maior a geração de renda, maior o investimento, maior a capacidade produtiva.”
“Quanto mais bem gerido é o município, mais atraente ele fica para novas empresas. E quanto mais bem gerido, mais as empresas que já estão no local se sentem bem para tocar seus projetos e contratar pessoas”, confirma o economista Cláudio Hamilton Matos dos Santos, técnico de planejamento e pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Para ele, “o crescimento econômico, em geral, é a combinação de esforço público e privado na mesma direção.”
Na opinião do advogado Paulo Ziulkoski, presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), “a empregabilidade, por si só, é tema recorrente para a avaliação positiva ou negativa do gestor. Mas, além disso, pesa a qualidade do serviço público prestado e a indução no sentido de que a iniciativa privada assuma também o seu papel.”
Brasília – O presidente da Confederação Nacional de Municípios, Paulo Ziulkoski – Foto José Cruz/Agência Brasil
Grupo focal
“O que vai diferenciar bom prefeito ou mau prefeito é a capacidade de induzir o desenvolvimento”, concorda a cientista política Karina Duailibi, especialista em pesquisas de opinião qualitativas, como as análises de grupo focal no qual os eleitores explicam por que votam ou não em determinado candidato. Ela considera que “emprego hoje faz parte da cesta de demandas da prefeitura”, e a pauta está em ascensão desde a segunda década do século.
Desde então, assiste-se no Brasil a desconcentração de empregos em grandes áreas metropolitanas em favor de cidades de porte médio (100 mil a 500 mil habitantes), motivada pelo agronegócio, pela abertura de novas unidades de saúde e pela interiorização da formação profissional em novos campi das universidades federais e estaduais (cursos superiores) ou dos institutos federais (cursos técnicos).
Com mais de 20 anos de experiência em pesquisa em diversas cidades do Brasil, Karina percebe que se tornou recorrente a avaliação positiva de prefeitos quando são identificados com a transformação urbana, a chegada de empresas e oportunidades. Eleitores participantes de grupos focais avaliam que o “prefeito ideal” tem capacidade de induzir desenvolvimento. “Hoje, isso faz parte das expectativas.”
O sociólogo Jorge Alexandre Neves, professor titular da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e diretor do Centro Internacional de Gestão Pública e Desenvolvimento, atesta que a pauta de emprego “é tema fundamental e costuma estar sempre entre os mais relevantes nas pesquisas de opinião.”
Ele alerta que a falta de propostas para a geração de emprego e a desatenção ao assunto por parte dos candidatos podem gerar reveses, especialmente se o postulante é um prefeito que busca a reeleição. “Isso pode contaminar negativamente a campanha se um município vizinho consegue muitos investimentos que trazem bons empregos e a cidade do eleitor não atrai recursos.”
“Entre os eleitores existe uma crença geral que as prefeituras cobram muito imposto, por isso as empresas não vão para o município”, acrescenta o engenheiro e administrador Gérson Engrácia Garcia, dono de um instituto de pesquisa de mercado e opinião com sede em Ribeirão Preto, no interior paulista.
Indutor ou empregador
A cientista política Karina Duailibi pondera que as perspectivas dos eleitores mudam conforme o porte da cidade. Em municípios menores, a maior esperança é que o emprego seja criado na prefeitura. “Quanto menor o município, mais a população é dependente da máquina municipal.” Nesses casos, “o prefeito não é um indutor de crescimento e ofertas de trabalho, mas o próprio empregador.”
Cidades pequenas não podem prescindir do repasse constitucional de verbas dos estados e da União e do pagamento de benefícios sociais, aposentadorias e pensões. “Quanto mais o município é dependente disso, mais forte é a prefeitura como empregadora”, ressalta.
Cláudio Hamilton Matos dos Santos, do Ipea, destaca que as transferências da União e dos estados resultam da descentralização de políticas públicas. “Os municípios têm tido cada vez mais atribuições e cada vez mais recursos para trocar essas atribuições”. Por isso, “o emprego municipal tem crescido muito fortemente ao longo das duas últimas décadas deste século.”
O presidente da CNM, Paulo Ziulkoski, afirma que os municípios têm a maior parcela de servidores públicos do Brasil, empregados na provisão de serviços essenciais à população. Dados de 2022, repassados à Agência Brasil pela entidade, contabilizavam que as prefeituras tinham 2,3 milhões de profissionais da educação. Na saúde, eram 1,3 milhão de profissionais atuando em atenção básica e outros atendimentos. Na área administrativa, as prefeituras empregavam mais de 1,2 milhão de servidores e técnicos. E nos serviços gerais, como limpeza e alimentação, 940 mil servidores municipais.
A CNM calcula que a remuneração média dos servidores municipais naquele ano era de R$ 3.604. Os salários pagos variam conforme o cargo que o servidor ocupa. Assim, a média da remuneração de médicos era de R$ 11 mil. Os funcionários dos serviços de limpeza e alimentação tinham remuneração média de R$ 1,8 mil.
Subemprego
De acordo com o Censo Demográfico 2022 (IBGE), sete de cada dez municípios brasileiros (total de 3.935 cidades) são considerados de pequeno porte, têm até 20 mil habitantes. Nessas cidades, os salários são menores e a empregabilidade também é mais reduzida.
Brumadinho, Minas Gerais – Imagem Google Maps
“As pessoas nas cidades menores não têm muitas oportunidades de trabalho. Ou trabalham na prefeitura ou no comércio local – esse não paga nem o salário mínimo e não faz registro em carteira de trabalho. Essas pessoas vivem do subemprego”, diz Gérson Engrácia Garcia.
De acordo com ele, o perfil mais exposto ao subemprego e até ao desemprego é o de pessoas com mais de 40 anos sem ofício, mães que querem voltar ao mercado de trabalho e jovens que se terminam o ensino médio, “não tem o que fazer”.
Nessas circunstâncias, as alternativas são o êxodo para municípios mais atrativos ou tentar o subemprego na própria cidade. “Então, um trabalha de mototáxi, o outro faz pequenos consertos, presta determinado serviço, ou vende bugigangas. As mulheres vendem peças íntimas, perfumes e cosméticos”, relata o pesquisador.
A candidata Ninha (PSD), de Marcação, no Litoral Norte da Paraíba, foi a única mulher indígena a ser eleita prefeita no Brasil nas Eleições 2024. Ela é da etnia Potiguara e conquistou 76,79% dos votos válidos no pleito desse domingo (6), o que corresponde a 4.922 votos.
“Como todos sabem, eu sou descendente indígena Potiguara, com muito orgulho. Eu comecei a trabalhar aos 15 anos de idade na gestão pública. Meus avós, Severina e João Correia, já eram políticos, não por eleição, mas políticos de sangue, pela vontade que eles tinham de ver Marcação crescendo. Eu sou muito grata a eles pela criação que nos deram, por essa ancestralidade Potiguara e indígena, que também está no sangue”, afirmou Ninha.
Ela derrotou na disputa Angélica Barreto (Republicanos), outra candidata indígena da etnia Potiguara. Angélica conquistou 23,31% dos votos válidos, o que corresponde a 1.496 votos.
Marcação tem tradição de eleger mulheres indígenas. A atual prefeita, Lili (DEM), também é indígena Potiguara e apoiava a candidata que saiu vitoriosa na disputa.
Outra curiosidade com relação à cidade é que todos os nove vereadores eleitos são indígenas. Compõem a Câmara Municipal de Marcação cinco homens e quatro mulheres, sendo que apenas três deles foram reeleitos. A renovação, assim, foi de 33,3%. Nas eleições de 2020, oito dos nove vereadores eleitos eram indígenas.
Cidade com maioria indígena
Toda essa força dos povos indígenas em Marcação não é à toa. Segundo o Censo de 2022, o município possui 8.999 habitantes, sendo que 88,08% do total são indígenas.
Isso significa que a população indígena é de 7.926 pessoas, sendo que 5.644 têm idade para votar.
Ao lado de sua vice Dra. Flávia Paredes (PSB), o candidato Raniery Paulino (Republicanos) agradeceu ao povo de Guarabira e à militância pelos quase 17 mil votos. O ex-deputado destacou o desafio de enfrentar uma estrutura de poder político e financeiro e o recado das urnas: de que a cidade está dividida, querendo mudança.
Em vídeo, Raniery e Flávia cumprimentaram os candidatos e a candidata eleita, Lea Toscano (União Br), reafirmando que pela confiança recebida de metade da população, na eleição mais acirrada dos últimos 16 anos, a responsabilidade aumenta e a luta em defesa do município vai continuar.
“Que campanha linda, propositiva e com muito engajamento. Sabendo, inclusive, do desafio de enfrentar uma estrutura de poder político e financeiro, mas, mesmo assim, o povo de Guarabira nos confiou, metade da cidade dizendo que queria mudança, que queria dias melhores. Manteremos a nossa luta em favor de Guarabira”, afirmou.
A médica Flávia Paredes também agradeceu ao povo e a Raniery pela parceria.
“Nosso coração é simplesmente gratidão. Gratidão a vocês que nos confiaram a chance de administrar Guarabira e por todo carinho recebido. Lançamos as nossas propostas e mantivemos a nossa palavra. Agora, pedimos a Deus que abençoe Guarabira, abençoe os próximos anos, abençoe a próxima gestão que irá começar. Nossa luta não acabou”, expressou.
“A luta continua”, reforçou Raniery.
O candidato Raniery obteve 16.566 (47,84%) votos. Foram 6.603 abstenções (15,29%) e 717 branco e 1.238 nulos.
A candidata à prefeita de Guarabira, Léa Toscano (44), conquistou mais um direito de resposta após a veiculação de uma notícia falsa no guia eleitoral de seu adversário, Raniery Paulino (foto). A decisão foi proferida pela juíza da 10ª Zona Eleitoral de Guarabira, Andressa Torquato Silva, em resposta à representação apresentada por Léa. Essa é a quarta derrota do adversário na justiça por propagar desinformação.
A campanha de Raniery Paulino havia divulgado informações no guia eleitoral, afirmando que Léa teria sido condenada por improbidade administrativa. A candidata, segundo explicou a coordenadora jurídica da Coligação ‘A Vontade do Povo’, Nathali Rolim, apresentou documentos oficiais que apontam que a condenação por improbidade foi afastada, já que a sentença foi anulada.
Na decisão, a juíza Andressa Torquato Silva determinou que a campanha de Raniery Paulino veiculasse a resposta de Léa no mesmo espaço e horário do guia eleitoral, garantindo a correção das informações. A omissão proposital da anulação da condenação de Léa foi julgada como uma tentativa de prejudicar sua imagem e influenciar negativamente os eleitores.
“Os meios de comunicação, embora sejam ferramentas importantes e essenciais para informar o eleitorado, não devem ser utilizados para propagar de notícias descontextualizadas ou incompletas ou para realizar propagandas que possam denegrir a imagem de outros candidatos, motivo pelo qual se faz necessária a intervenção judicial, a fim de fazer sanar tais irregularidades”, disse a magistrada.